Bandeja
Faço das minhas palavras alimento dos teus dias.
Como uma refeição, me sirvo inteira. De bandeja.
Você abre a tampa que esconde o que vai comer e se surpreende.
Eu suspiro e espero para ver como você organiza o banquete que eu te entrego.
O que vai por cima?
O arroz ou o feijão?
O sexo ou a paixão?
Na cama, você sabe, quem vai por cima, sou eu.
Mas quando eu me sirvo de bandeja sobre a tua mesa, eu perco o controle e te dou o poder.
Que tipo de talher você prefere?
Porque eu prefiro mesmo é quando você me come com as mãos e lambe os dedos molhados do caldo espesso que escorre, e te suja os dedos, a boca, a barba.
E depois, ainda não satisfeito, cai de boca e suga até a ultima gota do molho, ainda quente, e por vezes queima a língua. Mas nem se importa, porque é só assim que você se sacia.
Mas hoje quem escolhe como comer é você. Hoje eu só me sirvo. Me viro. E espero.
Pra ver se o meu sabor ainda te agrada ou se o seu paladar busca algo novo.
Eu não cozinho nada em fogo baixo, me falta calma e paciência.
Meu ponto é sempre mal passado pela pressa de chegar até sua boca.
E gosto, quando sem cerimônia, você começa pelo coração. Morde e engole de uma só vez.
As vezes, você me devora com tanta pressa, que mal percebe que eu mudei o tempero, o aroma.
Com a fome de uma vida você me traga.
Quando acabar, limpe e guarde os pratos.
E garanta que de mim, não sobre nada.
Não me guarde pra depois.
Nem pense em por na geladeira.
Não sou de restos. Sou de sobra.